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Posso Processar o Estado/Governo Após Ser Vítima de um Assalto?

 

Ser vítima de um assalto é uma experiência traumática que pode gerar não apenas prejuízos materiais, mas também danos emocionais profundos. Diante disso, muitas pessoas se perguntam: é possível responsabilizar o Estado ou o governo por não terem garantido a segurança pública? Afinal, a Constituição Federal estabelece que a segurança é um dever do Estado. Neste artigo, vamos explorar essa questão de forma detalhada, analisando a viabilidade de processar o governo após ser vítima de um assalto, com base em jurisprudências, legislações e doutrinas jurídicas.


O Dever do Estado na Segurança Pública

A Constituição Federal de 1988, no artigo 144, estabelece que a segurança pública é dever do Estado, sendo responsabilidade de órgãos como as polícias militar, civil e federal. Esse dispositivo leva muitos cidadãos a acreditar que, ao sofrerem um assalto, podem responsabilizar o governo por falha na prestação desse serviço. No entanto, a realidade jurídica é mais complexa.

Na prática, ingressar com um ação contra o Estado por danos morais ou patrimoniais decorrentes de um assalto é uma tarefa extremamente difícil. Isso porque a Justiça brasileira exige a comprovação de um nexo causal direto entre a ação ou omissão do Estado e o crime ocorrido. Em outras palavras, é necessário demonstrar que o assalto aconteceu devido a uma falha específica do governo, como negligência ou imperícia, algo que, na prática, raramente é alcançado.


Responsabilidade Civil do Estado: Objetiva ou Subjetiva?

Para entender se é possível processar o Estado, é importante compreender o conceito de responsabilidade civil do Estado, previsto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal:

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Esse dispositivo consagra a responsabilidade objetiva do Estado, ou seja, o governo pode ser responsabilizado independentemente de culpa, desde que o dano seja causado diretamente por seus agentes. Porém, no caso de assaltos, o crime é praticado por terceiros (criminosos), e não por agentes estatais. Nesses casos, a responsabilidade do Estado passa a ser subjetiva, exigindo a comprovação de culpa por omissão.


O Que Diz a Jurisprudência?


A jurisprudência brasileira reforça a dificuldade de responsabilizar o Estado em casos de assalto. Um exemplo é o caso de um paulistano que tentou processar o Estado de São Paulo após ter seu micro-ônibus roubado em 2008. O pedido foi negado em primeira instância e no Tribunal de Justiça, onde o desembargador Luiz Burza Neto argumentou que o Estado não pode ser responsabilizado por atos que não praticou diretamente.

No entanto, há exceções. Um caso emblemático ocorreu no Rio de Janeiro em 2005. A 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio condenou o governo estadual a indenizar uma vítima de assalto, mas a decisão foi específica: o tribunal considerou que o Estado foi omisso, pois o crime ocorreu em um local onde assaltos eram recorrentes, e não havia policiamento adequado. Mesmo assim, os danos materiais foram excluídos por falta de provas.


Esses casos mostram que, para ter sucesso em uma ação contra o Estado, a vítima precisa demonstrar:

1. Omissão específica: Provar que o governo falhou em adotar medidas de segurança em uma situação concreta, como a ausência de policiamento em uma área sabidamente perigosa.

2. Nexo causal: Evidenciar que a omissão estatal foi a causa direta do assalto.

3. Dano: Comprovar os prejuízos sofridos, sejam materiais (como bens roubados) ou morais (trauma psicológico).


Exceções: Quando o Estado Pode Ser Responsabilizado?

Embora seja raro, há situações em que o Estado pode ser responsabilizado por assaltos. Alguns exemplos incluem:

- Assaltos em locais sob administração estatal: Se o crime ocorrer em um parque público, estação de trem ou rodoviária administrada pelo governo, pode-se argumentar que houve falha na segurança do local. Um caso hipotético seria um parque com guarita de segurança desativada.

- Recorrência de crimes no mesmo local: Se o governo tem conhecimento de que determinado ponto é palco de assaltos frequentes e não toma providências, pode ser configurada omissão culposa.

- Assaltos em transportes públicos: Embora a responsabilidade primária seja da empresa concessionária (conforme o Código de Defesa do Consumidor), em alguns casos, pode-se questionar o governo se ele for responsável pela fiscalização do serviço.


Mas Será que Vale a Pena Processar?

Processar o Estado após um assalto é juridicamente possível, mas as chances de sucesso são reduzidas devido à dificuldade de comprovar a culpa estatal. Conforme destacado, ações contra o governo em casos de assaltos na rua raramente prosperam, pois o Estado não é considerado um “segurador universal”. Além disso, o processo pode ser demorado e custoso, especialmente se a vítima não contar com assistência jurídica gratuita.

Por outro lado, em situações específicas, como crimes em locais públicos com falhas evidentes de segurança, a ação pode valer a pena, desde que haja provas robustas. Consultar um advogado especializado em responsabilidade civil é fundamental para avaliar a viabilidade do caso.


Alternativas à Ação Contra o Estado

Se processar o governo não for uma opção viável, a vítima de assalto pode considerar outras medidas:

1. Registro de Boletim de Ocorrência: Essencial para documentar o crime e facilitar a recuperação de bens ou eventuais ações judiciais.

2. Ação contra terceiros: Em assaltos ocorridos em ambientes privados (como shoppings ou ônibus), é mais fácil responsabilizar a empresa responsável pela segurança. O Código de Defesa do Consumidor prevê a responsabilidade objetiva nesses casos.

3. Seguro privado: Contratar seguros para bens como celulares, carros ou joias pode mitigar perdas materiais.

4. Cobrança de políticas públicas: Pressionar o governo por mais investimentos em segurança pública, como aumento do efetivo policial ou melhoria da iluminação urbana, pode ser uma forma indireta de buscar mudanças.


Conclusão

Ser vítima de um assalto é uma situação que gera indignação e, muitas vezes, o desejo de buscar justiça. Contudo, processar o Estado por falha na segurança pública é um desafio jurídico significativo. A jurisprudência brasileira majoritariamente entende que o governo não pode ser responsabilizado por crimes praticados por terceiros, salvo em casos excepcionais de omissão clara e comprovada. Antes de iniciar uma ação, é crucial reunir provas e consultar um advogado para avaliar as chances de sucesso.

A segurança pública é sim dever do Estado, mas a complexidade dos fatores envolvidos na criminalidade faz com que a responsabilidade civil seja difícil de atribuir. Mais do que buscar indenizações, a solução a longo prazo passa por cobrar políticas públicas eficazes e investir na prevenção do crime. Enquanto isso, medidas como registrar o boletim de ocorrência e explorar outras formas de reparação podem ser caminhos mais práticos para as vítimas.


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